Capítulo 12 - O Custo do Perdão: Por que Cristo Precisou Morrer?
Ouvimos muito a frase: “Por que Deus não simplesmente perdoou? Por que Cristo teve que morrer? Deus parece um deus vingativo, daqueles tribais.”
Imagine que alguém lhe empresta o carro e o bate contra um muro. Independentemente da solução encontrada, alguém terá que arcar com as consequências. Se você perdoar, será você quem pagará; se não perdoar, será a outra pessoa; se dividirem, ambos pagarão. A dívida não desaparece. Mesmo o perdão significa assumir o ônus da infração cometida.
Agora, a maioria dos males que nos são causados é ainda pior, pois não pode ser calculada apenas em termos econômicos. A sensação de injustiça não desaparece simplesmente porque o outro pediu perdão. Muitas vezes, o que fazemos é romper relações com quem nos magoou, impondo assim algum sofrimento ou banimento emocional.
Geralmente, essas posturas — onde desejamos que o outro sofra de alguma maneira — nos tornam frios, autocentrados e, talvez, até preconceituosos, pois passamos a tomar as características de quem nos machucou como um alerta contra pessoas semelhantes (homens, pessoas ricas, marginalizados etc.). Ciclos de retaliação podem durar anos. O mal não desaparece com a vingança; ele apenas aumenta e se alastra, pois agora são dois fazendo o mal.
Porém, existe outra opção: podemos perdoar. Perdoar alguém que cometeu uma injustiça livremente é um tipo profundo de sofrimento para quem perdoa. Ou seja, somos nós que estamos arcando com o prejuízo. Mas é um sofrimento libertador; ele ressuscita o bem. Afinal, enquanto o ciclo de retaliação continua, quem nos fez o mal sempre estará vencendo, pois continua a nos afetar, a nos fazer praticar o mal, a nos levar a fazer coisas que não fazíamos e a sermos pessoas que não éramos.
A única forma de impedir que o mal se alastre é perdoando. Isso nos faz sofrer, mas é o que nos liberta. Isso não significa que não devemos confrontar o pecado — sim, devemos. Confrontar significa demonstrar as falhas, lutar para que o outro pare, para que não machuque mais pessoas. Mas perceba: isso vem do amor, não do ódio. A melhor forma de amar aqueles que pecam é confrontá-los para que mudem. A vingança, porém, a ausência de perdão, não vem do amor, pois apenas visa à nossa própria satisfação. Ela não deseja a chance de mudança ou cura do outro; enxerga o confronto apenas como uma forma de causar dor.
Jesus levou nossos pecados sobre si, assumindo os custos deles. O perdão divino nos mostra o preço do perdão que devemos ter como humanos. Quando ouvimos a pergunta “Deus não poderia simplesmente perdoar?”, devemos entender que perdoar significa arcar com a dívida existente do pecado. Todos os que perdoam assumem o efeito do pecado dos outros. Na cruz, vemos Deus fazendo, em escala cósmica, aquilo que devemos fazer, em menor escala, pelos outros. Na cruz, Ele arcou com a punição e os efeitos do mal e da dor dos pecados. Ele não agiu como as divindades tribais que exigiam o nosso sangue ou sacrifício, mas Ele mesmo arcou com o preço. Ofereceu o Seu próprio sangue a fim de honrar a justiça moral devida, para um dia destruir todo o mal sem ter que nos destruir.
É por isso que a cruz não é um exemplo de desperdício de vida, como se alguém provasse seu amor se jogando em um rio — isso seria errado. A cruz é algo extremamente necessário para salvar a humanidade. O sacrifício de Cristo não foi apenas um exemplo, mas algo essencial. A cruz não é um Pai sacrificando o Filho, mas, como cremos na Trindade, é o próprio Deus se entregando. No mundo real dos relacionamentos, percebemos como é impossível amar alguém cheio de problemas sem, de alguma forma, partilhar de suas dores e até mesmo se colocar no lugar dela. Amar pessoas completamente felizes exige muito pouco de nós, mas amar pessoas enfermas nos impacta diretamente.
Se alguém perseguido por um governo ou grupo poderoso lhe pedisse ajuda, você saberia que, caso se envolvesse, precisaria enfrentar a mesma perseguição e as mesmas dores. E, justamente por você estar disposto a partilhar da mesma insegurança, essa pessoa se sentiria mais segura. Isso demonstraria que você está na missão com ela. É isso que Cristo nos mostra na cruz: para nos salvar, Ele precisou se envolver, sofrer as nossas dores e enfrentar os efeitos de nossos atos para que soubéssemos que Ele estava conosco.
Olhe para as crianças. Elas nascem completamente dependentes. Elas não podem se desenvolver de forma saudável e correta se os pais não se envolverem ao ponto de abrir mão e sofrerem dores juntamente com elas. A escolha é clara: ou os pais se sacrificam, ou estarão sacrificando o filho. Alguém precisa se sacrificar. Para amar verdadeiramente os filhos, é necessário perder para que eles ganhem. É preciso partilhar da dependência deles para que possam desfrutar da independência e da condição dos pais. Para dar algo a eles, é preciso se sacrificar. Em outras palavras, só é possível transferir a força que temos para eles se absorvermos suas fraquezas, se carregarmos suas vulnerabilidades.
Tudo isso demonstra que Deus se identificou com a dor dos oprimidos, derrotando toda filosofia que exalta o poder e o prestígio, vencendo na cruz e demonstrando vitória por meio da renúncia, do serviço e da entrega total. Ele virou os valores do mundo de cabeça para baixo. O verdadeiro inimigo não era Roma, como muitos pensavam, mas os poderes do mal presentes na mentalidade. O Reino de Deus triunfou sobre os reinos deste mundo, recusando-se a participar de suas metas.
Nessa nova perspectiva, os cristãos enxergam o poder como algo a ser usado para servir, a riqueza como algo que permite doar, derrubando mentalidades de superioridade racial, de classe, de anseio por popularidade e fama. Os cristãos não precisam mais se autojustificar por beleza, profissão ou prestígio social, pois participam de uma contracultura onde dinheiro, sexo e poder deixam de nos controlar e passam a ser usados para doar — doar vida, edificar a comunidade e assim por diante.
Que orgulho posso ter, então? Se o Rei do universo abriu mão de Sua glória para ser desprezado e morrer numa cruz por mim? O que significo eu ou meus esforços? Nada. Cristo morreu para destruir toda ilusão de autonomia na salvação humana, para mostrar os efeitos de nossos pecados e para demonstrar que somente o servo pode alcançar a humildade necessária para ser grande. O fato de Jesus ter se alegrado em morrer por mim deve me libertar de todo o medo. Ele sabe que Seu sacrifício teve efeito.
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