The Spiritual World of Ancient Israel and Greece - Capítulo 1 - Deuses e Titãs

 


The Spiritual World of Ancient Israel and Greece - Capítulo 1 - Deuses e Titãs


O fato de os gregos (assim como diversos outros povos pagãos) acreditarem em poderes espirituais e cultuarem essas entidades não significa, necessariamente, que tais crenças eram meramente mitológicas ou inventadas. A presença recorrente de divindades e seres espirituais em diferentes culturas antigas sugere uma percepção comum: a existência de uma estrutura espiritual que governa ou influencia nações, territórios e eventos históricos.

Essa ideia de autoridades espirituais ligadas a regiões geográficas era amplamente difundida no mundo antigo. É bastante provável que a cosmovisão grega tenha sido influenciada por tradições mais antigas, especialmente as culturas semitas e os povos do Antigo Oriente Próximo, dos quais herdaram ou adaptaram certos conceitos espirituais.

É importante destacar, no entanto, que a mitologia grega não é uma tradição uniforme. Ela não apresenta um único sistema fechado ou uma fonte exclusiva. Suas histórias foram registradas e transmitidas por diversos autores, como Homero, Hesíodo e Orfeu, cada um oferecendo nuances diferentes sobre os deuses, heróis e a origem do mundo. Neste estudo, porém, não nos perderemos nas múltiplas variações acadêmicas. Em vez disso, buscaremos uma visão panorâmica e coerente, focando nos elementos centrais da mitologia grega que dialogam com a realidade histórica e com a fé cristã.

 Rephaim.

O nome Rephaim é utilizado no Antigo Testamento de forma sinônima e ocasional com Anakim, refletindo a antiga tradição de que ambos descendiam dos Nephilim, os gigantes antediluvianos descritos em Gênesis 6:4 como “homens poderosos da antiguidade, homens de renome”. Esses seres foram parcialmente responsáveis pela corrupção que levou ao juízo divino por meio do Dilúvio.

Na literatura ugarítica, o termo Rephaim está associado aos mitos cananeus que descrevem antigos reis guerreiros mortos, considerados poderosos e atuantes no submundo. Segundo essas tradições pagãs, os Rephaim formavam um conselho espiritual que legitimava a autoridade dos reis vivos, concedendo-lhes suposta aprovação divina. É nesse contexto que Isaías, ao dirigir sua profecia contra o rei da Babilônia (Isaías 14), emprega uma linguagem irônica e provocadora. Ele evoca a figura dos Rephaim no Sheol (o mundo dos mortos), não como senhores soberanos do além, mas como sombras fracas e impotentes, uma zombaria direta à glorificação pagã desses "espíritos ancestrais". Isaías declara que o rei babilônico, apesar de sua glória terrena, acabaria no mesmo destino: reduzido a um espectro sem poder, como os próprios Rephaim. Essa crítica reaparece em Isaías 26:14, onde esses mortos são mencionados como extintos e sem memória, contrapondo-se claramente à visão pagã de que continuariam exercendo influência após a morte.

Em suma, a Bíblia confronta diretamente a mitologia ilusória das nações ao declarar que, diante do verdadeiro Deus, até os mais poderosos caem no esquecimento e os conselhos dos mortos nada podem diante da soberania do Senhor.

Deuses e Titãs 

A mitologia grega apresenta doze deuses principais, conhecidos como os Deuses Olímpicos. Hades, apesar de ser irmão de Zeus, não era contado entre eles por governar o submundo. Antes desses deuses, existiam os Titãs, uma geração anterior de divindades que foram derrotadas pelos Olímpicos numa guerra de dez anos chamada Titanomaquia. A vitória marcou a substituição dos antigos deuses por novos, uma sucessão divina.

Após a vitória, Zeus dividiu o cosmos entre ele e seus irmãos: assumiu o céu, Poseidon ficou com o mar e Hades com o submundo. A terra era comum a todos. Apesar de parecer uma partilha igualitária, Zeus, como primogênito, reinava soberano entre os deuses, com autoridade suprema no Olimpo.

Os Titãs derrotados foram aprisionados no Tártaro, o abismo mais profundo do submundo. O poeta Hesíodo os chamava de “filhos da Terra”, destacando sua conexão com as profundezas ctônicas. Nesse ponto, a mitologia grega parece carregar ecos distorcidos de uma narrativa mais antiga: a queda dos "filhos de Deus" descrita em Gênesis 6:1–4, quando anjos rebeldes desceram à terra e corromperam a humanidade.

O apóstolo Pedro faz essa conexão em 2 Pedro 2:4–5, referindo-se ao “pecado dos anjos” nos dias de Noé e ao seu aprisionamento no Tártaro. Já em Judas 6–7, o texto afirma que esses anjos abandonaram sua morada celestial para se unir a “carne estranha”, sendo por isso mantidos em cadeias de escuridão até o juízo.

Embora a Bíblia não nomeie diretamente um lider rebelde principal, o livro apócrifo de 1 Enoque, citado e parafraseado por Judas, identifica Semihazah (ou Semyaza, Semjaza) como o líder de 200 anjos conhecidos como Vigilantes. Eles desceram ao Monte Hermom, juraram rebelião contra o Criador e ensinaram à humanidade segredos proibidos, como feitiçaria, sensualidade e magia oculta (1 Enoque 6–8). Assim como o pretensioso Helel ben Shachar de Isaías 14, Semihazah e seus companheiros foram lançados ao submundo como julgamento por sua tentativa de usurpar a autoridade divina:

1 Enoque 14:5 – “A partir de agora, você não poderá ascender ao céu por toda a eternidade, mas permanecerá dentro da terra, aprisionado por todos os dias da eternidade.”
2 Pedro 2:4 – “Pois, se Deus não poupou os anjos que pecaram, mas lançou-os no [Tártaro] e os entregou a cadeias de escuridão tenebrosa, para serem guardados até o juízo...”

Essa narrativa sobre a rebelião dos Vigilantes parece ser a verdadeira raiz da Titanomaquia grega, recontada sob uma nova ótica. O padrão permanece: seres celestiais tentam ascender além do que lhes é permitido, são julgados e lançados ao submundo. A diferença é que, na versão grega, os rebeldes triunfam. Zeus e os Olímpicos vencem os Titãs, são exaltados como heróis, enquanto os antigos deuses (que ecoam os Vigilantes) são vistos como vilões. É a clássica inversão moral das narrativas pagãs: os inimigos de Deus se tornam os protagonistas.

Essa ideia de substituição do deus do céu por um deus da tempestade aparece também em mitologias do Antigo Oriente Próximo. No mito hurriano-hititaKumarbi castra seu pai Anu, o deus do céu (como Cronos castra Urano na versão grega). Posteriormente, o deus da tempestade Teshub derrota Kumarbi e se torna o rei dos deuses, paralelamente a Zeus destronando Cronos e assumindo o trono no Olimpo.

Esse padrão repetido em diversas culturas (um deus da tempestade derrotando o deus do céu) pode refletir uma tentativa arquetípica de recontar a rebelião de satanás contra Yahweh. Em Ezequiel 28 e Isaías 14, profecias dirigidas aos reis de Tiro e Babilônia são interpretadas, por muitos estudiosos, como paralelos espirituais da queda de Lúcifer. O nome Helel ben Shachar (“estrela da manhã, filho da alva”) em Isaías 14 é visto como uma referência direta ao inimigo de Deus que tentou usurpar o trono celestial e foi lançado às profundezas.

Nos mitos pagãos, porém, essa figura triunfa. Enquanto na narrativa bíblica Yahweh permanece soberano e invencível, nas versões mitológicas, os deuses celestiais antigos (análogos a Deus) são derrubados e substituídos por seus inimigos. Assim, essas mitologias funcionam como "contra-narrativas": reinterpretações da história original com o enredo subvertido — os vilões tornam-se heróis, e os heróis, vilões.

A analogia que melhor representa a estrutura dessas mitologias comparadas à narrativa bíblica seria a seguinte:

  • Urano (deus primordial do céu) simbolizaria o Deus Criador/Yahweh;

  • Cronos (que castra Urano) representaria a primeira geração de rebeldes celestiais — os anjos caídos ou Semihazah e os Vigilantes;

  • Zeus (que derrota Cronos e assume o trono) representa uma nova geração de rebeldes que triunfa na versão mitológica, mas que, na versão bíblica, falha — um paralelo possível à tentativa de satanás de usurpar o trono divino.

Portanto, a mitologia grega (e outras orientais) parece ser uma versão invertida e corrompida da narrativa bíblica, na qual o mal é celebrado e o bem é derrotado — uma estrutura clássica de subversão espiritual presente em muitas tradições religiosas do mundo antigo.


Gaia e a Grande Deusa


Na mitologia grega, Gaia ocupa um papel primordial essencial na origem do cosmos, embora não atue sozinha. De acordo com Hesíodo, no princípio havia o Caos, seguido por Gaia (a Terra), juntamente com Eros (o impulso da procriação). Gaia deu origem a Urano (o Céu), e ambos se uniram para gerar a primeira geração de deuses, os Titãs, como mencionado anteriormente.

O estudioso grego Robin Hard observa que, embora Gaia seja frequentemente descrita com características pessoais, ela jamais foi plenamente antropomorfizada como outros deuses, como Zeus ou Hera. Isso provavelmente se deve ao fato de Gaia ser a própria casa física da criação — o solo fértil que gerou todas as criaturas vivas, inclusive a humanidade. Por seu caráter de nutridora, ela foi chamada de “Mãe de Todos”, “a mais antiga de todos os seres, que sustenta a vida e traz prosperidade ao gênero humano por meio de suas colheitas e do gado que alimenta.”¹³⁴

Desde meados do século XIX, alguns estudiosos clássicos passaram a defender o que a historiadora Cynthia Eller denominou de “mito da pré-história matriarcal”. Segundo essa hipótese, a religião original da humanidade — anterior à invenção da escrita e, portanto, “pré-histórica” — teria sido centrada na figura da “Grande Deusa”, símbolo supremo do feminino. Nessa sociedade primitiva idealizada, as mulheres ocupavam posição central como sacerdotisas da Deusa, fontes de paz, nutrição e ordem social. Eventualmente, porém, esse modelo teria sido destruído por uma revolução patriarcal, que impôs uma sociedade dominada pelos homens, marcada por guerra, desigualdade e opressão. Os defensores desse mito desejam um retorno ao culto da Grande Deusa, que, segundo eles, traria harmonia entre os sexos, equilíbrio com a natureza e restauração espiritual — identificada com a própria Gaia.¹³⁵

Entre neopagãos contemporâneos e adeptos do chamado “Movimento da Deusa”, Gaia é frequentemente exaltada como símbolo máximo desse mito matriarcal, embora muitos também vejam a Grande Deusa como uma fusão arquetípica de várias divindades femininas do mundo antigo. Alguns estudiosos chegaram a propor Hera ou Atena como a autêntica “Grande Deusa” da antiguidade grega, por serem as divindades patronas das duas cidades mais antigas da Grécia: Argos e Atenas.¹³⁶

No entanto, Cynthia Eller desmonta esse mito moderno, classificando-o como uma projeção cultural do feminismo contemporâneo, carente de qualquer comprovação documental (por se referir a um período pré-escrita) e com escasso respaldo arqueológico:

“Também não há nada no registro arqueológico que esteja em desacordo com uma vida de caça pré-histórica desagradável, rude e dominada por homens... E quaisquer religiões que os povos pré-históricos praticavam, podemos afirmar com segurança que o culto à deusa não gerava automaticamente culturas de paz e fartura lideradas pelas sacerdotisas da deusa. Esse padrão não foi encontrado em lugar nenhum.”


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